segunda-feira, 20 de junho de 2011

Uma mãe melhor (ainda) depois da separação


No meio das dificuldades que chegam após a separação, muitas mulheres descobrem que se tornaram mães ainda melhores. A jornalista Katia Michelle Bezerra, mãe de Helena, 7 anos, e separada há dois, conta como isso aconteceu com ela e com outras mulheres que já não vivem mais junto com o pai de seus filhos

Logo que me separei, estava em uma viagem de trabalho e um rapaz muito bonito se aproximou de mim no aeroporto, puxando conversa: ‘Você viaja muito?’, perguntou. Eu logo disparei, com olhos marejados: ‘Não. Depois que minha filha nasceu, fiquei mais em casa e depois da separação é ainda mais difícil deixá-la’. O que um desconhecido no aeroporto tem a ver com uma situação tão íntima vivida por mim, que normalmente sou bem mais discreta, eu não sei. Mas sei que eu queria afastar qualquer risco de distração de uma maternidade que estava cada dia mais latente.

Quando me casei, queria uma família. Nunca cogitei não ter filhos, apesar dos médicos serem meio reticentes quanto à minha fertilidade. Não foi uma obsessão, mas, quando engravidei, borboletas passaram a voar dentro de mim. Fiquei completamente apaixonada pela ideia de que um ser crescia dentro de mim e nem me dei conta que aqui fora as coisas começavam a degringolar. Helena nasceu há sete anos e me trouxe um outro dia a dia que eu tive que aprender aos poucos, assim como ela ia crescendo.

Quando minha filha tinha 5 anos, depois de algumas idas e vindas, eu e o pai dela nos separamos definitivamente. A partir daí, nós duas ganhamos de presente uma nova vida também. Quando duas pessoas têm um filho, duas culturas e seus conjuntos de crenças se unem para uma educação. Sozinha, eu tive que decidir se a fada do dente existe, se o coelhinho deixa pegadas na Páscoa e se o Papai Noel joga os presentes pelo telhado ou os deixa na porta da frente. Além é claro, de coisas bem práticas: artesanato ou natação depois da aula? Sobra dinheiro para isso? Ela continua na mesma escola, cuja mensalidade não consigo dar conta sozinha?

Me deparar com todas essas responsabilidades me deu medo. Mas quando se tem uma pessoa dependendo de você, o medo também impulsiona para frente. Não sei quem foi que disse que a gente precisa aprender a viver o que não planejamos. E lá estava eu, ou melhor, nós, em um vida que nunca pensei ter, mas à qual precisava me adaptar bem rapidinho.

Sem família na cidade onde moro, me mudei para perto da escola para facilitar a logística, troquei de emprego para algo mais estável e fui me adaptando às situações e suas adversidades. Nos primeiros meses, me voltei completamente para a Helena. Eu, que já era supreprotetora, tentei protegê-la ainda mais. Ficava tão perto, cuidando para que ela não sofresse, que nem me dei conta que talvez a estivesse sufocando.

ESTOURE A BOLHA

A verdade é que crianças se adaptam com muita facilidade às novas situações. Uma vez, uma colega olhou para minha filha com cara de dó e disse: ‘Que bom, agora você terá duas casas e vai ganhar dois presentes de Natal: um do papai e outro da mamãe’. E ela prontamente respondeu: ‘Mas é o Papai Noel quem traz os presentes!’ Na sua simplicidade, Helena foi resolvendo as coisas, o que não impediu, claro, de alergias aparecerem e o comportamento ficar mais arredio na escola.

A cada novo sintoma eu procurava a solução que achava mais rápida: homeopatia, terapia, deixar dormir mais tarde. Um chocolate? Não acho que tenha passado do ponto, mas vejo outras situações em que a mãe quer compensar a ‘perda’ de alguma forma e acaba exagerando no trato com a criança. Olhando para trás eu acho, sim, que me equivoquei em algumas situações. Era como se eu quisesse transformá-la na menina-bolha, igual àquele filme do John Travolta, ou forrar a terra inteira de colchões macios para que qualquer queda dela – física ou emocional – não doesse tanto quanto aquilo que eu estava sentindo.

Com o tempo, aprendi a não ser tão superprotetora. Entendi que as adversidades são também um motivo de crescimento e a cada dia a estimulo mais a desenvolver suas habilidades e a tomar decisões sozinha, do alto da maturidade dos seus 7 anos. Um exemplo? Depois de quase dois anos entre indas e vindas na minha cama, hoje ela é a primeira a ir para o quarto dela. Lê um livro, grita boa noite e apaga a luz, enquanto eu fico pensando no quanto ela amadureceu – e eu também – depois da separação.

NEM SEMPRE É RUIM

A psicóloga Lidia Weber, autora de mais de 15 livros sobre educação infantil, diz que as mães são quase sempre exageradas e isso fica mais evidente ainda com a separação. ‘Quando as mães se separam, acabam ficando sobrecarregadas com o dia a dia e elas são superlativas em tudo em relação ao pai, tanto para as coisas boas quanto para as coisas ruins’, diz.

Para ela, essa sobrecarga, somada à queda na situação econômica que normalmente uma separação acarreta, deixa as mães mais estressadas e consequentemente mais aptas a práticas inadequadas. Ela acompanhou uma pesquisa com 400 estudantes universitários que foi apresentada recentemente em um congresso na Itália. ‘É o que chamamos de pesquisa retroativa. Para saber como as mães agem, não adianta perguntar a elas e sim para os filhos’, explica.

Foram classificados cinco tipos de mães, baseados nas respostas e situação dos filhos na casa dos 20 anos: mães ótimas; mães em crise conjugal; mães medianas; mães zangadas e mães terríveis. ‘A maioria das mães que se separam são do segundo grupo, pois mesmo depois da separação não deixam de brigar com os ex-maridos’. Se a relação com o parceiro é ruim, isso pode causar problemas à criança. Nem sempre uma boa mãe vai conseguir lidar bem emocionalmente com a separação, portanto, é preciso que você se cuide e, se precisar de ajuda, procure um terapeuta

E, sobre isso, preciso dizer que tenho muito a aprender. Ainda não consegui enterrar todas as mágoas, mas é uma luta constante para mim. Tento ser cordial, mas percebo que isso é pouco para pais de uma menina linda e inteligente como Helena.

A boa notícia é que essa situação não acontece com todo o mundo. É possível ter separações tranquilas, quando pais e mães colocam a educação e o bem-estar dos filhos acima de tudo. ‘Existe uma solução para tudo. Nós aprendemos nossos comportamentos e quando tomamos consciência de que algo está errado, podemos mudar’, enfatiza a psicóloga.